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Vereadores de Curitiba rejeitam homenagem a Marielle Franco

XV CURITIBA
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Com 30 votos favoráveis, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou, nesta segunda-feira (14), uma homenagem ao reverendo Roberto Brasileiro Silva, que é uma das lideranças nacionais da Igreja Presbiteriana. Por iniciativa de Noemia Rocha (MDB), ele receberá a Cidadania Honorária de Curitiba, que é o maior título que o Legislativo pode conceder a uma pessoa que não é nascida na capital do Paraná. Natural de Guimarânia (MG), ele é pastor há 37 anos e está no quinto mandato como presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil (006.00013.2021). 

Roberto Brasileiro também é um dos curadores do grupo educacional Mackenzie, que em Curitiba assumiu o Hospital Evangélico no ano de 2018, integrando-o à rede do Instituto Presbiteriano Mackenzie. Além da trajetória do homenageado na comunidade evangélica, Noemia Rocha destacou a importância do Hospital Evangélico Mackenzie para a cidade de Curitiba como justificativa para a concessão do título. “Ele é um “homem extremamente bom e ético, que demonstra um testemunho vibrante e uma preocupação com a educação”, disse a parlamentar. A homenagem foi corroborada, em plenário, por Ezequias Barros (PMB).

A proposta recebeu quatro votos contrários, do bloco PT-PV (Maria Leticia, PV; Carol Dartora, Professora Josete e Renato Freitas, do PT), e duas abstenções, das vereadoras Indiara Barbosa e Amália Tortato, do Novo. Após o resultado, Noemia Rocha afirmou que a proposta, na opinião dela, deveria ter sido aprovada por unanimidade. “Não poderia ter um voto contrário, pela robustez do trabalho do grupo Mackenzie aqui na cidade”, lamentou a parlamentar. Para Barros, o PT teria votado contrário por se tratar de uma liderança religiosa.

“É mentira dizer que o PT sempre vota contra homenagens a religiosos. Na maioria, somos favoráveis. Nenhum voto aqui é dado pela religião. Nós defendemos a liberdade religiosa”, respondeu Josete, após Maria Leticia ter dito que o bloco discordava do posicionamento político do homenageado e Carol Dartora tê-lo chamado de “uma figura controversa, um bolsonarista declarado”. O projeto volta ao plenário nesta terça-feira (15), para discussão em segundo turno.

CMEI Marielle Franco
O tom da discussão no projeto anterior antecipou como seriam as duas horas seguintes no plenário da CMC, até o plenário decidir, por 17 a 11 votos, com 8 abstenções, arquivar o projeto de lei da vereadora Carol Dartora (PT) que denominava um Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) da capital como Marielle Franco (009.00005.2021). Na data de hoje, faz quatro anos que a parlamentar carioca foi assassinada a tiros, na companhia do assessor parlamentar Anderson Gomes, que dirigia o carro em que estavam, no Rio de Janeiro. O crime ainda não foi solucionado.

O projeto encontrou em plenário três tipos de objeções diferentes. Sargento Tânia Guerreiro (PSL) e Osias Moraes (Republicanos), por exemplo, questionaram a falta de vínculo direto de Marielle Franco com a cidade de Curitiba, argumentando que isso é exigido pela lei 8.670/1995. Éder Borges (Pode) e Ezequias Barros (PMB) questionaram atrelar o nome de uma creche à figura de Marielle Franco, que defendia o aborto e a descriminalização das drogas. Para Denian Couto (Pode) e Professor Euler (PSD), antes da questão de mérito, está o entendimento dos parlamentares de que a CMC deveria suspender a votação deste tipo de projeto.

“Se não foi aprovado hoje, vai ser aprovado na próxima legislatura, porque a luta vai avançar, porque vocês não vão nos barrar, não vão nos impedir. Eu entrei, eu sou a primeira [mulher negra eleita vereadora] e outras depois de mim virão, e essa luta vai avançar. [O projeto em homenagem a Marielle Franco] vai ser reapresentado, e reapresentado, e reapresentado, e reapresentado até que essa transformação aconteça. Que essa transformação é imparável”, disse Dartora, durante o debate. 

“Eu entrei aqui com ameaças de morte. Essa não é uma luta individual nem partidária, pois é uma luta social. A inclusão das mulheres negras é uma luta social e a Marielle representa isso. Não é mais um macho branco rico, é uma mulher preta periférica que simboliza muito para as pessoas. Não é Eder Borges que dá significado para a vida de Marielle Franco, é o mundo”, rebateu Carol Dartora, lembrando que a família da ex-vereadora carioca já foi recebida duas vezes pelo Papa Francisco, autoridade da Igreja Católica.

Dartora disse isso em resposta a Borges ter chamado Marielle Franco de “grande propagadora do aborto, do assassinato de crianças inocentes no ventre das suas mães”, de “drogada”, que era “suspeita de ligação com o crime organizado”, que teve “uma vida irregular, para não dizer promíscua”. “Que exemplo uma mulher dessas pode ser para as nossas crianças?”, perguntou o parlamentar. “Marielle Franco morou no Rio de Janeiro, ela não fez nada por Curitiba, então [de acordo com a lei] fica vetado qualquer coisa com o nome dela”, disse Tânia Guerreiro.

Osias Moraes afirmou que sem a conclusão da investigação sobre a morte da vereadora carioca não poderia ter uma convicção sobre a vida dela. E que, como não vislumbrou identificação dela com Curitiba, perguntava-se “qual o sentimento dos pais em relação à homenageada? Como vão se sentir na escola?”. Antes, Ezequias Barros havia dito que  as investigações do assassianto de Marielle e Anderson estavam tão inconclusas quanto a do atentado de Adélio Bispo contra o então candidato à presidência Jair Bolsonaro. 

Com a discussão em plenário sendo ríspida, o presidente da CMC, Tico Kuzma (Pros), lembrou que os vereadores poderiam ser advertidos pelo Conselho de Ética conforme suas atitudes e uso de palavras de baixo calão. Em dado momento, durante manifestação de Maria Leticia, ela pediu a Eder Borges que interrompesse seus comentários fora do microfone. “Eu não admito ser interrompida por esse fulano”, reclamou, classificando o acontecido de violência política de gênero. “É um absurdo e uma vergonha para a CMC permitir que alguém se manifeste dessa forma”, disse Leticia, que é a procuradora da Mulher da Câmara de Curitiba.

Maria Leticia disse que a discussão do aborto é um fenômeno mundial e que, se defender a descriminalização das drogas fazia de Marielle Franco uma drogada, que ela própria e que o líder do governo, Pier Petruzziello (PTB), tinham projetos na Câmara sobre o uso da cannabis medicinal. “Ela não defendia bandido, Marielle defendia direitos iguais para todos, pois todos têm direito à defesa”, continuou Leticia. A ela se somou Dalton Borba, lembrando que a lei das denominações permite homenagens a “figuras, fatos e datas representativas da história local, nacional ou geral”, logo não precisaria haver vínculo direto com Curitiba.

Dizendo-se perplexo “pela grande desinformação que permeia o discurso de muitos”, Dalton Borba defendeu que aprovar a denominação era aceitar que Marielle Franco tornou-se um símbolo do combate ao racismo e que Curitiba deveria estar agradecendo [essa oportunidade] de entrar para o rol das cidades que lutam por direitos fundamentais”. “O que mais lutamos é pelo direito de voz do brasileiro e dos seus representantes. O que fizeram com o direito de voz da Marielle? Calaram. Sobrou para ela que nós sejamos a voz dela no país inteiro”, disse Borba.

“Marielle foi uma referência para todas as mulheres, mas, principalmente, para as negras e periféricas, que, a partir da sua luta, conseguiram galgar mais espaços. Pode parecer um projeto singelo, que não tem importância, mas está debatendo as chagas do Brasil”, acrescentou Professora Josete. Após a justificativa, Euler sugeriu que na próxima vez que o projeto for trazido a plenário, na próxima legislatura, seja proposto alterar o nome genérico de um CMEI já existente pelo de Marielle Franco, dando especificidade ao projeto. Já Denian Couto, antes, apenas disse que “nós [vereadores] custamos muito caro ao povo de Curitiba para ficar discutindo se Marielle Franco deve, ou não, ser o nome de um CMEI”.

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