O plenário da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) fechou a pauta do Mês da Consciência Negra, nesta terça-feira (30), com nova votação favorável ao projeto que reserva 20% das vagas em concursos e processos seletivos à população negra e indígena, de forma progressiva. De iniciativa da vereadora Carol Dartora (PT), a proposta de lei será encaminhada para a sanção ou o veto do prefeito Rafael Greca.
O resultado da análise em segundo turno, nesta manhã, foi de 30 votos favoráveis e 5 contrários (005.00033.2021). A justificativa para as cotas étnico-raciais é a promoção da igualdade racial, buscando aplicar ação afirmativa já existente nos concursos em âmbito federal. Dartora ponderou que “séculos de escravidão não serão resolvidos com apenas um projeto de lei”, mas diz acreditar que, dentro da luta antirracista, este é um exemplo de atitude concreta em busca da igualdade racial.
“Foi um dia histórico à Câmara Municipal de Curitiba. A gente teve um longo debate [em primeiro turno, a discussão durou mais de seis horas] e ficou ratificada a importância das políticas reparativas, para tirar nossa cidade do atraso”, declarou a autora. Ela lembrou de todo o diálogo para que a proposta de lei, em trâmite na CMC desde janeiro, chegasse à pauta no Mês da Consciência Negra: “Este foi um projeto construído a muitas mãos, com muito diálogo, respeito”.
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João da 5 Irmãos (PSL) parabenizou Dartora pela proposta de lei. “[O projeto] traz um pouco de justiça a essa dívida social que temos com o povo negro. Precisamos avançar nessa pauta. Aproveito para fazermos o convite aos vereadores desta Casa à Comissão Especial da Visibilidade Negra [do qual é vice-presidente]”, concluiu.
Implantação progressiva
O texto submetido à votação em plenário, nessa segunda-feira (29), depois de pouco mais de seis horas de discussão, foi um substitutivo assinado por Dartora e mais 19 vereadores, protocolado na última sexta-feira (26). A principal mudança, em relação ao texto que tramitava desde o começo do ano, é que a implementação das cotas para a população negra e indígena, nos concursos e processos seletivos da administração direta e indireta do Município, será progressiva. Ou seja, o sistema de cotas étnico-raciais deve começar com a reserva de 10% das vagas, a partir da data da publicação da lei, e ter o acréscimo, a cada dois anos, de 2%, até o Município chegar ao percentual de 20% (031.00114.2021).
A matéria manteve a autodeclaração, conforme critérios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), como requisito inicial para a inscrição às vagas reservadas. Após diálogo com o Executivo, a homologação dessas inscrições foi condicionada à “heteroidentificação pautada na fenotipia”, conforme critérios e procedimentos definidos em decreto e no edital do concurso ou processo seletivo.
Além de Dartora, assinaram o substitutivo os vereadores Alexandre Leprevost (Solidariedade), Dalton Borba (PDT) Flávia Francischini (PSL), Hernani (PSB), Jornalista Márcio Barros (PSD), Marcos Vieira (PDT), Maria Leticia (PV), Noemia Rocha (MDB), Osias Moraes (Republicanos), Pier Petruzziello (PTB), Professora Josete (PT), Professor Euler (PSD), Renato Freitas (PT), Salles do Fazendinha (DC), Serginho do Posto (DEM), Sidnei Toaldo (Patriota), Tico Kuzma (Pros), Tito Zeglin (PDT) e Toninho da Farmácia (DEM).
Critério racial ou social?
Com o aval, nessa segunda, à proposição de diversos vereadores, ficou prejudicado o substitutivo da Comissão de Educação, Cultura e Turismo, apresentado, em agosto passado, por iniciativa da presidente colegiado, Amália Tortato (Novo). A ideia era implantar as cotas sociais, para candidatos com renda familiar per capita mensal de até um salário-mínimo e meio e que tenham cursado o Ensino Médio na rede pública ou como bolsistas (031.00059.2021).
Diversas referências na área e movimentos sociais acompanharam o debate em primeiro turno – dividido entre os períodos da manhã e da tarde, com a participação de 15 parlamentares. Em geral, os argumentos favoráveis às cotas para a população negra e indígena citaram a política de reparação e que o racismo vai além da questão econômica. Na outra ponta, vereadores que defendem as cotas sociais apontaram o chamado “tribunal racial” e a subjetividade da proposta aprovada.
“A questão social, econômica, não é igual à questão racial. Sempre alguém julgando você pelos olhos, diminuindo você”, comparou. “Você pode ter dinheiro. A falta de oportunidades é por você ser negro. Você tem uma Ferrari, mas você é negro” disse Renato Freitas (PT). Herivelto Oliveira (Cidadania) sugeriu que Amália Tortato retirasse o substitutivo da Comissão de Educação, para que a proposta fosse discutida em um segundo momento. “As cotas sociais também são de suma importância”, ponderou. Outros vereadores também se manifestaram, nessa segunda, a favor das cotas raciais.
Com discurso comum de rejeição ao racismo e ao preconceito, os vereadores Indiara Barbosa (Novo) e Eder Borges (PSD), além de Amália Tortato, declaram apoio à proposta das cotas sociais. “O racismo não é aceitável em nenhum lugar, sob nenhuma circunstância”, afirmou Amália. “Reconheço sim que existe racismo no nosso país, na nossa cidade. A maior divergência está na forma de solucionar o problema”, declarou Indiara. Para Borges, “é injusto nós culparmos a cidade, chamarmos a cidade de racista”.
As sessões plenárias têm transmissão ao vivo pelos canais da CMC no YouTube, no Facebook e no Twitter.