A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, com um placar de 14 votos a 12, o Projeto de Lei nº 2.234/22, que libera os jogos de azar no Brasil. Entre eles, encontram-se a operação de cassinos, bingos e até o jogo do bicho. A proposta ainda depende de aprovação do plenário do Senado e da sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Um dos principais argumentos favoráveis à liberação consiste no impacto econômico da regulação das referidas atividades. Elas movimentaram entre R$ 14,3 bilhões e R$ 31,5 bilhões em 2023 – valores obtidos de uma base de dados de 2014 corrigida pela inflação. Como comparativo, o orçamento federal para o PAC é de R$ 61,3 bilhões em 2024.
“A aprovação na CCJ do Senado aumenta a possibilidade de que o país encerre uma proibição existente desde o ano 1941 em relação à operação de jogos de azar, revogando, inclusive, trechos da Lei de Contravenções Penais, que enquadrava essas atividades como contravenções. A visão de quem é favorável à liberação destas atividades é de que elas, na prática, movimentam muito dinheiro ilegalmente no mercado e sem o devido controle do Estado. Com a regulamentação, espera-se que o Poder Público e a sociedade possam extrair também os potenciais econômicos destas atividades. Além disso, espera-se que a legalização dos jogos de azar possa estimular o comércio e turismo nacional em locais que possuam cassinos, por exemplo, impedindo que o dinheiro saia do país”, destaca Thiago Priess Valiati, sócio do escritório Razuk Barreto Valiati e doutor em direito administrativo pela Universidade de São Paulo (USP).
O aumento de arrecadação por parte do Estado será oriundo de dois novos tributos que serão criados e pagos pelas entidades que operem jogos e apostas: a Taxa de Fiscalização de Jogos e Apostas (Tafija) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a comercialização de jogos e apostas (Cide-Jogos).
A Tafija deverá ser paga ao Tesouro Nacional a cada três meses. Já a Cide-Jogos terá alíquota de até 17% incidindo sobre a receita bruta das empresas que exploram os jogos – ou seja, a diferença entre o total de apostas realizadas e os prêmios pagos. Os ganhadores de prêmios com valores superiores a R$ 10 mil deverão pagar 20% de Imposto de Renda retido na fonte.
“No Projeto de Lei, a divisão da arrecadação está prevista entre Fundo de Participação dos Estados (16%), Fundo de Participação dos Municípios (16%), Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (12%), ações na área do esporte (10%) e Fundo Nacional da Cultura (10%)”, destaca Thiago Valiati. “Por sua vez, o restante da arrecadação deverá ser destinado à prevenção ao vício em jogos, saúde, segurança pública, proteção dos animais, financiamento estudantil, auxílio a desastres naturais e fundo de crianças e adolescentes”, diz.
Se o potencial econômico consiste no mote dos favoráveis à liberação, há um outro perfil de parlamentes contrários à medida. O principal argumento é de que a dependência em jogos e apostas se equivale a de drogas e álcool, por exemplo.
O que o PL regulamenta?
Somente empresas registradas e sediadas no Brasil poderão oferecer jogos de azar, mediante prévia licença do Ministério da Fazenda. As empresas precisarão comprovar a origem lícita de seus recursos e ter capital mínimo variando de R$ 10 milhões para bingos e jogo do bicho à R$ 100 milhões para cassinos.
O texto do Projeto estabelece diversas regras para a transparência e a fiscalização das apostas. “Todas as apostas e prêmios deverão ser registrados em um sistema específico, denominado Sistema de Auditoria e Controle (SAC), que poderá ser acessado em tempo real pelo Ministério da Fazenda”, explica Valiati. No caso de descumprimento das regras, as atividades podem ser suspensas por até 180 dias, cassadas e sofrerem multas de até R$ 2 bilhões por infração.
As autorizações concedidas serão inegociáveis e intransferíveis, válidas para estabelecimentos físicos ou virtuais autorizados pelo governo federal. Essas empresas poderão exercer algumas atividades, como:
Cassinos – A autorização e instalação de cassinos só será permitida em polos turísticos ou em complexos de lazer. Uma das emendas prevê a limitação de um cassino por Estado, com exceção de unidades com maior população ou território, caso de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Amazonas e Pará. Também haveria liberação para implantação de cassinos em embarcações marítimas e fluviais. As operações em ambos os casos seriam liberadas por 30 anos.
Bingos – Serão autorizados bingos – eletrônicos ou vídeo – em todos os municípios e um a cada 150 mil habitantes em cidades maiores. Seu funcionamento será autorizado por 25 anos, renováveis por igual período.
Jogo do bicho – Com exploração por até 25 anos e renovação pelo mesmo período, o credenciamento será validado para uma pessoa jurídica a cada 700 mil habitantes.
Máquinas – O Projeto de Lei também regulamenta o aluguel de máquinas de apostas e obriga o registro junto ao poder público, assim como a realização de auditorias periódicas. A divisão da exploração é de 40% para a empresa locadora e 60% para o bingo ou o cassino a partir da receita bruta.
Quem pode jogar?
O Projeto prevê que apenas maiores de idade poderão participar dos jogos. Pessoas jurídicas, indivíduos com compulsão em jogos, insolventes, ligadas a empresas de jogos ou agentes públicos fiscalizadores também serão impedidas de participar. Há proibição também para pessoas condenadas por lavagem de dinheiro, tráfico de pessoas, exploração de prostituição e terrorismo.
A proposta cria a Política Nacional de Proteção aos Jogadores e Apostadores, que exigirá que as casas de apostas mantenham serviços de atendimento e mecanismos de prevenção ao vício em jogos. Para isso, será instituído o Registro Nacional de Proibidos (Renapro), um cadastro de pessoas que serão impedidas de realizar apostas e ingressar em cassinos e outros locais onde os jogos são realizados, inclusive aplicativos e sites eletrônicos.
“Sem dúvidas, é um projeto muito polêmico e envolve interesses antagônicos porque aborda uma série de atividades que são consideradas contravenções desde a Lei de Contravenções Penais, de 1941. A aprovação pela CCJ já gerou uma série de movimentações de parlamentares que são contrários à medida, então é possível que a votação do projeto pelo Plenário do Senado não seja realizada tão cedo. Devemos aguardar com cautela, mas a liberação nunca esteve tão próxima”, destaca Thiago Valiati que também é Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Regulatório (IBDRE) e que tem debatido e estudado a exploração de jogos e casas de apostas no país.
Para mais informações sobre o escritório Razuk Barreto Valiati, acesse o site https://www.razuk.adv.br/.