Especialização técnica, integração de dados e leitura social tornam-se fatores estruturais no desempenho eleitoral
As campanhas eleitorais modernas operam em um ambiente tecnicamente mais complexo. Dados do relatório Digital 2025: Brazil, do DataReportal, indicam que cerca de 144 milhões de brasileiros estavam ativos em redes sociais no início de 2025, o equivalente a aproximadamente 68% da população, enquanto a penetração da internet alcançou mais de 86% do país. Em paralelo, estudos recentes sobre consumo de informação apontam que a maioria dos eleitores acessa notícias por múltiplas plataformas digitais, reduzindo a eficácia de estratégias centralizadas e ampliando a necessidade de coordenação entre diferentes áreas profissionais.
Esse cenário tem redefinido a forma de planejar, executar e comunicar projetos políticos. Se antes campanhas eram estruturadas em torno de poucos estrategistas e de uma lógica predominantemente intuitiva, hoje a competitividade eleitoral depende da atuação integrada de equipes multidisciplinares, capazes de interpretar dados, comportamento social, contexto político, ambiente regulatório e linguagem digital em tempo real.
Segundo o publicitário e estrategista de marketing político Guto Araujo, que participou de seis campanhas presidenciais no Brasil e na América Latina, o eleitor contemporâneo é impactado por múltiplas narrativas simultaneamente. “Campanhas vencedoras deixaram de ser resultado de uma única liderança criativa ou de decisões isoladas. Elas são construídas por times que combinam estratégia política, comunicação, dados, tecnologia, direito eleitoral e leitura permanente de cenário”, afirma.
A centralidade dos dados é um dos principais vetores dessa transformação. Pesquisas quantitativas frequentes, estudos qualitativos, análise de engajamento em redes sociais e monitoramento de sentimentos digitais passaram a orientar decisões diárias de agenda, discurso e posicionamento. Nesse modelo, estatísticos, analistas de dados, cientistas políticos e especialistas em tecnologia trabalham de forma integrada com estrategistas e equipes de comunicação. “Hoje, intuição sem evidência virou risco operacional. A campanha precisa medir, testar e ajustar continuamente”, destaca Araujo.
Outro fator decisivo é a fragmentação da comunicação política. Ainda de acordo com o Digital News Report 2025, 78% dos brasileiros afirmam se informar prioritariamente pela internet, enquanto apenas 10% mantêm o hábito de consumir jornais impressos, evidenciando a predominância do ambiente digital e a multiplicidade de canais de informação. “Narrativas precisam ser adaptadas a diferentes públicos, plataformas e formatos, exigindo a atuação coordenada de redatores, designers, produtores audiovisuais, gestores de mídia e especialistas em plataformas digitais”, revela o estrategista.
Além disso, o ambiente eleitoral tornou-se mais juridicamente sensível e regulado. O próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem ampliado sua atuação sobre propaganda digital, uso de dados e novas tecnologias, incluindo debates sobre inteligência artificial nas eleições. “Esse cenário levou advogados eleitorais e especialistas em compliance a integrarem o núcleo estratégico das campanhas, reduzindo riscos que podem comprometer candidaturas inteiras”, diz.
Essa lógica multidisciplinar, para Guto Araujo, não é uma tendência conjuntural, mas uma mudança definitiva. “A campanha moderna funciona como uma organização complexa, com alta pressão de tempo, fiscalização intensa e mudanças rápidas de cenário. Quem não estrutura equipes diversas e integradas tende a perder competitividade”, avalia.
O resultado desse modelo é uma campanha mais ágil, menos improvisada e mais conectada à realidade social. “Em um cenário de eleitores mais críticos, informados e expostos a múltiplas influências, vencer uma eleição deixou de ser apenas uma questão de discurso ou visibilidade. Tornou-se, sobretudo, um exercício coletivo de inteligência estratégica”, finaliza.




