A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) manteve, com 24 votos favoráveis, 10 contrários e 1 abstenção, o veto parcial do Executivo à lei municipal 15.810/2021, que reconhece a educação, por meio da oferta de aulas presenciais, como uma atividade essencial durante a pandemia da Covid-19. De iniciativa de Denian Couto (Pode), Amália Tortato e Indiara Barbosa, ambas do Novo, o projeto foi aprovado pelos vereadores na semana de carnaval, em regime de urgência (005.00037.2021).
A sanção, com o veto ao parágrafo 1º do artigo 1º da lei, foi assinada pelo prefeito Rafael Greca no dia 12 de março. O dispositivo suprimido afirmava que “o exercício das atividades presenciais não estará sujeito à suspensão ou interrupção, cabendo ao Poder Executivo estabelecer restrições, com as normas sanitárias e os protocolos a serem seguidos, inclusive quanto à ocupação máxima dos estabelecimentos”.
Na justificativa do veto parcial, o Executivo argumenta que o parágrafo “afronta a legislação vigente, sobretudo as normas que regem a situação de emergência enfrentada em razão da pandemia”. O ofício cita a lei federal 13.979/2020, que delega aos Executivos, por decreto, “resguardar o abastecimento de produtos e o exercício e o funcionamento de serviços públicos e de atividades essenciais”. Também decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que respalda aspectos da norma enquanto durar a pandemia do novo coronavírus.
Os vetos, assim como as indicações e requerimentos sujeitos à análise do plenário, são deliberados em um turno, e não em duas etapas. O sistema é o da maioria absoluta – ou seja, sua rejeição dependeria do voto de pelo menos 20 vereadores, o equivalente à “metade mais um” das cadeiras do Legislativo da capital. Na semana passada, por 6 votos a 3, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da CMC se manifestou pela legalidade dos argumentos do Executivo e a manutenção do veto.
Debate
O debate sobre o veto parcial foi pautado por critérios legais. Com ou sem o parágrafo vetado, defendeu Denian Couto, a lei estaria sendo descumprida porque determina, já no caput do artigo 1º, a oferta das aulas presenciais nas redes pública e privada da capital. “Essa é a razão da atividade essencial, de que não pode ser fechada. Ela pode ser limitada. A limitação da atividade essencial está dentro da autonomia de qualquer governante”, afirmou. Assim como não fecha a farmácia, como não fecha o supermercado.” As restrições, citou, poderiam incidir sobre o horário das escolas e o número de alunos em sala de aula, por exemplo.
“Manter ou derrubar o veto não muda a lei”, reforçou. “É dever do gestor público respeitar a lei, sob pena de enquadramento em crime de responsabilidade. A decisão de não retomar as aulas na rede municipal de ensino prejudica justamente a camada mais pobre da população.” Para Denian Couto, o argumento de invasão de competência exclusiva do prefeito não se sustenta pelo próprio veto parcial e seria uma “aberração jurídica”. “Ou a lei toda teria que ser inconstitucional, e teríamos que estar diante de um veto total.”
Na mesma linha, Indiara Barbosa contestou o argumento do Executivo por se vetar um parágrafo, e não o projeto na íntegra. Mesmo diante de uma situação de “máximo alerta”, opinou a vereadora, o ideal é a oferta as aulas presenciais, com restrições e conforme os protocolos sanitários, pelo menos aos filhos dos profissionais das demais atividades essenciais, como os trabalhadores da saúde. “E mandar os filhos para a escola é opcional”, acrescentou ela, já que a lei faculta aos pais e responsáveis a adoção do ensino remoto.
Amália Tortato defendeu que ela e os demais autores da lei não querem a retomada das aulas “a qualquer custo”, e sim de uma maneira segura. Conforme a vereadora, está sendo articulada a criação de uma frente parlamentar para a fiscalização do atendimento dos protocolos sanitários nos estabelecimentos de educação.
Líder do prefeito na Câmara de Curitiba, Pier Petruzziello (PTB) defendeu a manutenção do veto parcial. “Quanto ao mérito, tenho um posicionamento muito claro, que não tem nada a ver com o veto. […] O vereador Pier é nitidamente favorável à abertura das escolas públicas”, comentou. “Vamos ao veto prefeitoral. Esse dispositivo do projeto de lei que prevê a impossibilidade de suspender a aula presencial na pandemia é sim inconstitucional. O prefeito de Curitiba não discorda que a educação é essencial em nenhum momento.”
“A competência para decretar medidas sanitárias, o que inclui a suspensão das aulas presenciais, é do chefe do Poder Executivo, por força do artigo 3º, parágrafo 9º, da lei federal 13.979/2020, que foi declarado constitucional pelo STF e permanece em vigor enquanto durar a pandemia”, continuou Petruzziello. “O fato de eu defender a escola pública estar aberta não faz com que eu consiga votar algo flagrantemente inconstitucional, já declarado pelo Supremo Tribunal Federal.”
Dalton Borba (PDT) definiu o veto parcial, conforme sua experiência como professor de Direito Constitucional, como “uma aberração, um Frankenstein jurídico”. “Fui contra a aprovação deste projeto porque entendi que era inconstitucional. Todo ele, porque entendo que era uma atribuição do prefeito”, apontou. “Ou esta Câmara se mantém coerente ao que fez, quando aprovou o projeto, ou nós estaremos de fato declarando a fragilidade de nossas decisões por uma decisão política, e não jurídica, do Poder Executivo.”
“Não fui contra declarar a educação como atividade essencial. Votei contra pelo jeito como ele foi proposto. Mas após ouvir vereadores que me antecederam e fazer algumas pesquisas, mudei meu entendimento”, continuou Professor Euler (PSD). “Se a Câmara decidiu que a educação é essencial, e se o prefeito concordou, visto que ele fez um veto apenas parcial, então o funcionamento da educação precisa ser resguardado. Se há aula presencial para os alunos da rede particular e só aulas remotas para os alunos da rede pública, há algo muito errado.”
“O prefeito não está desrespeitando nenhuma lei. Não há nenhuma aberração jurídica”, rebateu Pier Petruzziello. Em contraponto aos vereadores contrários ao veto parcial, o líder defendeu que o ensino remoto durante a pandemia também é resguardado pela lei federal 14.040/2020. Ainda em sua avaliação, “se tiver uma catástrofe em Curitiba, eles não querem [com o parágrafo suprimido] que feche escola”.
Na justificativa do voto favorável ao veto parcial, Marcelo Fachinello (PSC) apontou que “a essencialidade está garantida pela lei em vigência” e ter sido o autor de emenda ao texto, aprovada em plenário, especificando que o âmbito da lei é a pandemia da Covid-19. O papel dos vereadores, avaliou, passa ser cobrar protocolos efetivos que ofereçam segurança aos alunos e professores, sem que se potencialize ainda mais abismo entre as redes pública e privada.
“A bancada do PT votou pela manutenção do veto porque concordamos com o parecer aprovado na Comissão de Constituição e Justiça”, afirmou Professora Josete (PT). Ela disse que os parlamentares do partido foram contrários à aprovação do projeto de lei, em fevereiro, por entenderem que cabe ao Executivo determinar o que é essencial e por discordarem do mérito da proposta. Um dos argumentos da bancada é a retomada das aulas presenciais apenas com a vacinação de todos os profissionais das escolas.