A tradicional broa de centeio curitibana recebeu, no dia 28 de fevereiro, o título de Patrimônio Cultural Imaterial de Curitiba. O reconhecimento foi concedido pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural pelo “saber fazer” essa iguaria que há mais de 150 anos faz parte da identidade gastronômica da capital paranaense, presente na mesa das famílias e nas mais antigas padarias da cidade.
O pedido de tombamento foi apresentado pelo Sindicato da Indústria da Panificação e Confeitaria do Estado do Paraná (SIPCEP) e por mais de um ano passou por análises e debates antes da aprovação. Este é o terceiro bem imaterial da cidade registrado pelo Conselho Municipal desde a sua criação, em 2016. O primeiro foi a Feirinha do Largo da Ordem, em 2018, e as gameleiras da praça Tiradentes, em 2024.
O título reforça a importância histórica e cultural da broa de centeio, que chegou à cidade com os imigrantes da Europa Central no final do século XIX. Colonos vindos da Polônia, Alemanha, Rússia, Bielorrússia e Ucrânia trouxeram a tradição da panificação com centeio, adaptando-a ao longo das décadas.
Pelo relato do Conselho, em Curitiba, a receita adquiriu características próprias, como a alta proporção de centeio (pelo menos 40%) misturado ao trigo e o uso de fermentação natural. Essa mistura ocorreu entre as décadas de 1920 e 1940, com o racionamento do trigo, especialmente no período da Segunda Guerra Mundial.
“Foi entre esse período que a broa curitibana ganhou sua principal característica e se diferenciou da broa pura de centeio, mais amarga e que não agradava tanto ao paladar da população. Mas, não existe um padrão, uma receita única, mas um modo de fazer que é tradicional e característico de um povo”, destaca o diretor de Patrimônio Histórico de Curitiba, Marcelo Sutil.
Além disso, ao contrário de outras regiões do Sul do Brasil que também receberam imigrantes dessa região da Europa e que tem tradição em broas, a versão curitibana abandonou ingredientes como milho e batata. A broa de centeio em Curitiba virou símbolo do convívio social e foi servida em eventos históricos da cidade, como a visita do Imperador do Brasil, Dom Pedro II, no século XIX, e a do Papa João Paulo II, em 1980.
Legado gastronômico
Para Eduardo Henrique Engelhardt, proprietário da Padaria América e vice-presidente do SIPCEP, a importância do registro é a permissão para potencializar e alavancar os mecanismos de transmissão da tradição das broas de centeio.
“O registro (Patrimônio Cultural) nos credencia a ir nas escolas, fazer atividades com as crianças, ir aos professores de gastronomia, criar festivais exclusivos com os produtores de broa, ir aos bares e restaurantes para transmitir esse saber e essa tradição da broa de centeio, garantindo que ela se perpetuará entre as próximas gerações”, destaca Eduardo.
A ideia do legado da broa é, segundo Eduardo, contribuir não só com o turismo gastronômico de Curitiba, mas também fazer com que os curitibanos conheçam a receita e possam voltar a fazer as broas de centeio em suas próprias casas.
A ideia é reforçar a broa como parte da identidade e do cotidiano de Curitiba. Para isso, Eduardo destaca o papel de padarias tradicionais nesse processo, como Família Farinha, América, Brioche, Piegel, entre outras.
“A broa de centeio transcende a própria receita. Desde 1913, o carro-chefe da padaria América é a broa de centeio, que mantém a mesma receita e o modo de preparo, mas assim como ela, diversas padarias têm as broas de centeio como carro-chefe, ou está entre os produtos mais vendidos”, aponta.