Câmera de Curitiba aprova avanço de projeto que cria regras para fiscalizações em terreiros

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Fotos: Júlia Schneider/CMC

A 33ª reunião ordinária da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Municipal de Curitiba (CMC), nesta terça (2), foi marcada pelo debate a respeito da proposta para estabelecer salvaguardas às manifestações de religiões de matriz africana na Lei do Silêncio, por iniciativa da vereadora Giorgia Prates – Mandata Preta (PT). Além dessa aprovação, outras 11 propostas de lei receberam sinal verde para tramitar em outras comissões da Casa Legislativa, enquanto 7 foram arquivadas e outras 26 seguem tramitando na própria CCJ (leia mais aqui).

A sessão contou com a presença de representantes de terreiros e de coletivos de direitos humanos, que acompanharam de perto a discussão sobre garantias de liberdade religiosa. O debate sobre manifestações sonoras de caráter religioso evidenciou disputas que envolvem identidades culturais, racismo religioso e a atuação do poder público. A reunião se consolidou como um espaço de escuta e de afirmação da pluralidade democrática.

A proposta da vereadora Giorgia Prates prevê a alteração na Lei do Silêncio (lei municipal 10.625/2002), para estabelecer salvaguardas às manifestações sonoras das religiões de matriz africana, reconhecendo a natureza litúrgica de atabaques e cânticos, que não se equiparam a atividades recreativas. A autora teve espaço na CCJ para defender seu projeto. 

“Hoje, a legislação municipal não oferece parâmetros mínimos sobre como proceder diante de denúncia contra um terreiro. E essa ausência de diretrizes prejudica a todos, prejudica as comunidades religiosas que ficam vulneráveis às interpretações subjetivas e a práticas desiguais. Prejudica o servidor público que age sem referência legal segura, exposto a conflitos e a riscos administrativos, mesmo quando tenta cumprir o seu dever”, disse Giorgia Prates.

O projeto, segundo ela, introduz parâmetros técnicos claros para a atuação dos agentes de fiscalização, como a exigência de aferição sonora por profissional habilitado e a vedação da interrupção de cultos em andamento. Giorgia Prates destacou que práticas desproporcionais têm resultado em violações recorrentes contra comunidades afetadas por racismo religioso.

Ocorrências de perturbação de sossego

O relator Da Costa (União) explicou que inicialmente havia proposto o arquivamento, mas revisou sua posição após diálogo com a autora e consulta à Procuradoria Jurídica (Projuris) da CMC, concluindo pela devolução à autora. Como ex-policial militar e cristão, ele entendeu ser importante ressaltar a diferença entre o parecer técnico da CCJ e a atuação de um agente de segurança que vai atender uma ocorrência de perturbação de sossego.

“Eu já atendi [a ocorrências policiais] em terreiro, em igreja evangélica, em festa, já atendi a diversos tipos de perturbação de sossego”, disse Da Costa, ressaltando que, em regra geral, o policial orienta para abaixar o som quando se trata de denúncia anônima. Quando o reclamante quer representar, ele explicou que o policial não tem escolha a não ser encaminhar as partes para uma delegacia.

O vereador ressaltou que não se trata de tratamento diferenciado nem de interferir na liberdade religiosa de qualquer pessoa. “Já aconteceu em igreja evangélica. Eu sou cristão, vou em igreja evangélica. E muitas vezes alguns pastores extrapolam […], colocam uma caixa de som no último volume. Eles querem, sei lá, deixar Jesus surdo de tanto que gritam. Capaz que [Ele] já esteja, porque gritam muito no ouvido Dele, e eu acho que não precisa”.

Parâmetros para fiscalizar terreiros

Camilla Gonda (PSB), por sua vez, apresentou voto em separado pela tramitação, afirmando que o projeto não invade competência administrativa do Executivo, mas disciplina o exercício do poder de polícia ambiental em conformidade com garantias constitucionais. Destacou que a legislação atual não oferece parâmetros suficientes para fiscalizações em terreiros.

O colegiado abriu espaço para a manifestação do público presente, representada por Eduardo Filho, que durante três anos foi diretor de Igualdade Racial, Povos e Comunidades Tradicionais na Secretaria de Estado da Mulher, Igualdade Racial e da Pessoa Idosa. Ele destacou que instrumentos musicais como atabaques são considerados sagrados e, por isso, não se pode retroceder quando há leis federais e estaduais que já garantem essa proteção jurídica às religiões de matrizes africanas.

Após intenso debate, o colegiado da CCJ aprovou a tramitação por maioria. Com essa decisão favorável, a proposição segue agora para análise da Comissão de Direitos Humanos, Defesa da Cidadania, Segurança Pública e Minorias.

 

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