Futebol, pastel, caldo-de-cana e Luís Fernando Verissimo

Edson Lau
3 Min de leitura
Foto: Divulgação

Domingo era dia de futebol, na quadra do Colégio Adventista de Santo André, depois, era a hora do pastel. Voltávamos
meu pai e eu, ele se vangloriando de alguma única jogada razoável durante a manhã e ambos com uma fome que só se resolvia com pastel e caldo-de-cana. Mas o além da feira também havia um momento muito esperado: a banca de jornal.

Meu pai comprava O Estado de São Paulo. Uma grossa resma de papel que parecia pesar mais que a privação do zagueiro absoluto. Eu, político precoce, tentava convencê-lo a levar também um gibi do Batman. Às vezes cedia, a maioria não, mas eu insistia.

Enquanto ele folheava o jornal como quem lê o destino, eu já sabia o que queria: dois cadernos. No de Esportes, ia atrás de notícias do Corinthians e das tabelas do futebol internacional, porque era importante saber se o Milan continuava ganhando tudo e se o Real Madrid ou Barcelona continuariam sua disputa acirrada. Mas o melhor era o Caderno 2. Ali, entre colunas carregadas de saudosismo de João Ubaldo Ribeiro, eu encontrava o que me prendia: as crônicas de Luís Fernando Verissimo.

Era como entrar no meio de uma conversa que já estava boa antes de eu chegar. Um humor que não gargalhava, só sorria. Um texto que dizia tudo e parecia não dizer nada. Hoje, ele partiu. E eu fiquei aqui, lembrando que, no fundo, foi ali, entre um pastel de vento e uma vírgula do Verissimo, que além de tomar gosto pela leitura, aprendi que a vida também é feita de crônicas.

Como recepção de Luís Fernando Veríssimo no céu:

Lindanura, prestimosa como uma mãe de noiva apontou-lhe o caminho entregando uma cuia.

― Buenas, tchê ― saudou o Analista. ― Se abanque no más.

Observou que na mesa havia uma plaqueta: Mort. Ed Mort. O velho detetive de sobretudo amassado levantou os olhos cansados e deu aquele meio sorriso:
— Demorou, parceiro.

Verissimo senta e ganha um pastel de vento, que obviamente é roubado da pastelaria vizinha do cubículo de Mort.

Servido por um anjo com cara de maître, ali mesmo começa a anotar mentalmente as histórias que vai de lá acompanhar… Imagino ele rindo sozinho, com aquele humor que cabia no meio de uma frase curta.

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