A Polícia Federal divulgou nesta terça-feira (26) um relatório que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em uma tentativa de golpe de Estado após a eleição de 2022. O documento, agora sem sigilo por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR). Bolsonaro foi mencionado 516 vezes, sendo apontado como um dos principais articuladores dos atos antidemocráticos que buscavam impedir a posse do governo legitimamente eleito.
Segundo a PF, Bolsonaro “planejou, atuou e teve o domínio de forma direta e efetiva” sobre as ações da organização criminosa que pretendia abolir o Estado Democrático de Direito. Embora o golpe não tenha se concretizado, isso se deu por “circunstâncias alheias” à vontade do ex-presidente. A investigação detalha uma trama de ações clandestinas que envolveram planos para assassinar o então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), e o ministro Alexandre de Moraes.
De acordo com a PF, o plano de golpe já vinha sendo elaborado desde 2019, contando com a participação de outros membros do governo e de militares. Entre as principais revelações, está a existência de uma carta assinada por oficiais do Exército que visava incitar os militares a aderirem à tentativa de golpe. O relatório também aponta que Bolsonaro tinha “pleno conhecimento” do plano para assassinar Lula e Alckmin, como parte de um esquema que pretendia “extinguir” a chapa vencedora das eleições de 2022. O documento, batizado de “Punhal Verde e Amarelo”, foi impresso dentro do Palácio do Planalto, sob ordens do general Mario Fernandes, à época secretário executivo da Secretaria-Geral da Presidência.
Outro ponto importante é a elaboração de um decreto que prevê uma “ruptura institucional”, com o apoio de um “núcleo jurídico” que ajudou Bolsonaro na criação de um documento que estabeleceria a decretação do Estado de Defesa no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A ideia era legitimar a intervenção por meio de um subterfúgio jurídico, abrindo caminho para a anulação das eleições. No entanto, os comandantes do Exército e da Aeronáutica se mostraram contrários a qualquer tentativa de impedir a posse do governo eleito, enquanto o então comandante da Marinha, Almir Garnier, manifestou apoio à iniciativa.
A investigação também revela um plano de fuga para Bolsonaro, caso a tentativa de golpe falhasse. A documentação encontrada no notebook do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente, continha uma apresentação com a sigla “RAFE/LA”, que significava “Rede de Auxílio à Fuga e Evasão” e “Linha de Auxílio à Fuga e Evasão”, mostrando que a eventualidade de deixar o país já estava prevista.
Em uma reunião no Palácio do Planalto, Bolsonaro chegou a apresentar uma “minuta do decreto golpista” aos comandantes das Forças Armadas, buscando o apoio para implementar o plano. Segundo as provas obtidas, Bolsonaro contava com a participação de Filipe Martins na elaboração e tentativa de convencer os militares. Contudo, o plano não foi adiante devido à resistência dos comandantes da Aeronáutica e do Exército.
Além disso, a PF relatou que Bolsonaro e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, disseminaram uma falsa narrativa de fraude nas eleições de 2022. Mesmo com os comandantes das Forças Armadas assegurando que não havia qualquer indício de fraude no processo eleitoral, Bolsonaro insistiu na tese de fraude, reforçando seu discurso em diversas ocasiões. Também foi identificado que Alexandre Ramagem, à época diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), repassou dados falsos sobre o sistema eleitoral para Bolsonaro, numa tentativa de desacreditar o processo eleitoral brasileiro.
O relatório da PF aponta uma rede de conluios e ações para garantir a permanência de Bolsonaro no poder, mesmo após a derrota nas urnas em 2022. Os desdobramentos das investigações indicam que o ex-presidente não apenas tinha pleno conhecimento dos planos, mas desempenhou papel ativo na tentativa de subversão da ordem democrática no país.