Um levantamento feito pela organização Pew Research Center, comparou o grau de satisfação das pessoas sobre a democracia em seus países, não é surpresa ver que 68% dos estadunidenses estão insatisfeitos. O recente debate entre Donald Trump e Kamala Harris foi um reflexo claro da polarização e do estado de crise da democracia americana.
De um lado, Trump, com seu estilo caracteristicamente agressivo, retomou a retórica de que sua visão é a única capaz de salvar o país, apelando à base conservadora e aos que compartilham de uma visão ultranacionalista e autoritária. Do outro, Harris, repetiu a estratégia democrata, de tratar seu adversário como o “weirdo”, o esquisitão, tentou mostrar postura mais centrada e superior.
O que mais se destacou no debate foi o contraste entre a força bruta de Trump e o pragmatismo contido de Harris, que fez de tudo para fugir de sua associação com o atual presidente Joe Biden. Trump, com seu histórico de manipulação de informações e desdém por normas democráticas, continua a explorar o medo como arma política. Seu discurso reflete uma visão de mundo na qual a verdade é secundária, e a lealdade cega à sua figura se sobrepõe a qualquer debate racional. O ex-presidente chegou apelar à mentira de que imigrantes estariam comendo cães!
Harris, por outro lado, também deslizou com a desinformação referente ao desemprego legado pelo Governo Trump, mas tentou se manter como alguém mais razoável, tendo uma postura de conciliação e defesa de reformas. O problema de seu discurso, que apesar de parecer técnico, repleto de dados e números, é que a execução do seu programa depende de amplo apoio do Legislativo, imensurável. Além disso, pesquisas recentes apontam o descontentamento da população norte-americana com os rumos da economia, em especial com a alta da inflação, e Harris não se conectou com os eleitores neste ponto.
O grande problema do debate, no entanto, é que ele expõe um sintoma maior: a profunda crise de legitimidade que assola a política americana. A polarização afetiva, agravada por figuras como Trump, tornou qualquer debate político um campo minado. Não há mais espaço para a complexidade, e o discurso público se limita a slogans simplistas que escondem questões mais profundas.
O que é realmente assustador é o quanto Trump tem conseguido normalizar o absurdo. Sua recusa em respeitar normas e convenções é vista por muitos como uma demonstração de força, e não como a ameaça que realmente é à democracia. Harris pode ter aparentado vencer o debate em termos de conteúdo e coerência, mas a questão é se isso ainda importa.
Pesquisas de opinião recentes, em especial nos estados decisivos, mostram que a eleição de Trump continua sendo muito provável. Sua permanência no cenário político e sua insistente distorção dos fatos mostram que a realidade já não é mais o critério final para a política.
O já citado levantamento da Pew Research Center, mostra que não são apenas os estadunidenses os insatisfeitos com a democracia. Apenas para ficar nos exemplos da América do Sul e da Europa: argentinos (55%), brasileiros (54%), colombianos (77%), peruanos (89%), franceses (65%), britânicos (60%), italianos (67%) e espanhóis (68%), também estão insatisfeitos.
No fim das contas todos estes dados e o debate entre Trump e Harris são lembretes gritantes de que os Estados Unidos e as democracias estão em um momento decisivo: é hora de promover a de reconexão com os anseios da população e de dar respostas concretas, ou então, a verdade e a razão continuarão sendo derrotadas pelo populismo e o autoritarismo.