O Vaticano reforçou nesta sexta-feira (17) as normas para avaliar supostos eventos sobrenaturais, como a Virgem Maria chorando e crucifixos pingando sangue, fenômenos que historicamente mobilizam a fé católica. Em um novo documento, que substitui as diretrizes de 1978, a Congregação para a Doutrina da Fé determinou que os bispos devem consultar o Vaticano antes de investigar tais eventos e não podem mais reconhecer sua natureza “sobrenatural” por conta própria. Esse poder agora é exclusivo do papa e dos escritórios centrais do Vaticano.
O papa Francisco já expressou ceticismo em relação a esses eventos, afirmando à TV italiana RAI que as aparições da Virgem Maria “nem sempre são reais” e que prefere vê-la “apontando para Jesus” em vez de chamar a atenção para si mesma.
Eventos relatados pelos fiéis, como o aparecimento de “estigmas” (as feridas da crucificação de Jesus) nas mãos e nos pés de pessoas, frequentemente resultam em santuários e peregrinações. O cardeal Víctor Manuel Fernández, chefe da Congregação para a Doutrina da Fé, destacou que esses eventos devem ser avaliados com cautela para evitar fraudes e exploração para “lucro, poder, fama, reconhecimento social ou outros interesses pessoais”.
De acordo com o novo documento, os bispos devem emitir um nihil obstat, uma autorização que permite a adoração enquanto deixa em aberto a possibilidade de o fenômeno ser formalmente reconhecido pelo Vaticano como “sobrenatural”. Este reconhecimento, no entanto, é considerado “muito excepcional”.
Além do nihil obstat, os bispos têm outras cinco opções ao avaliar supostos eventos sobrenaturais, incluindo a rejeição formal ou a imposição de medidas para proibir ou limitar a adoração de fenômenos controversos ou claramente falsos. O documento citou como exemplo de confusão passada as supostas aparições da Virgem Maria em Amsterdã nas décadas de 1940 e 1950, que foram consideradas inválidas em 2020 após décadas de veredictos conflitantes. “Foram necessários cerca de 70 anos excruciantes para concluir toda a questão”, disse o Vaticano.
A proliferação de supostos fenômenos religiosos, alguns obviamente falsos, foi um dos fatores que contribuíram para a divisão do cristianismo e o surgimento do protestantismo na Europa no século 16.